quinta-feira, 7 de março de 2013

[Crítica] O Mestre


Em sua obra Anticristo, Nietzsche redige uma crítica à teologia, expondo a arrogância do homem ao achar que é tão distante dos animais, pensando que para chegar ao ápice precisa ignorar seus sentimentos mais sinceros - para o filósofo tudo isso não passava de mentira.

Depois do épico Sangue Negro, o cineasta Paul Thomas Anderson resolve, novamente, tocar em temas que, numa sociedade pouco questionadora, são polêmicos. Ao mesmo tempo que mantém um grande estudo de personagens através de relações paralelas que tudo tem a dizer sobre seus dramas e motivações.

Pois se a relação entre o capitalista Daniel Plainview e o pastor era que ambos só estavam atrás de poder, movidos pela ganância, em seu novo filme, Paul Thomas Anderson desenvolve o Aprendiz e Mestre com uma complexidade ainda maior.

Num EUA pós-guerra, o que não faltavam eram pessoas perturbadas, problemáticas, que fariam de tudo para se incluir em um grupo e até ouviriam qualquer pessoa que falasse que iria curá-las. E foi ai que um escritor de ficção científica se aproveitou disso para fundar um culto, dizendo que os problemas eram de vidas passadas e que poderiam ser destruídos se submetessem ao seu tratamento.
O filme narra a ascensão da cientologia, assim como a história de um homem problemático e selvagem (bêbado, viciado em sexo) que contrapõe o polido e culto "mestre" - fundador da religião.
Mas O Mestre está longe de ser um filme sobre a cientologia - é um estudo sobre a origem dos cultos, da estrutura humana. Quando o mestre começa a discursar sobre sua religião, Paul Thomas Anderson corta o áudio e foca nas expressões - não queremos conhecer a religião, mas sim os envolvidos nisso. A introdução ao personagem Freddie Quell nos dá uma perspectiva inicial de sua natureza, e que brilha ainda mais com a atuação de Joaquin Phoenix: corcunda, distorcido, perturbante, inconsequente e sempre investindo em expressões irônicas e um olhar arrependido.
Os figurinos também são certeiros em passar como o protagonista não se encaixa em nenhum lugar: enquanto todos do culto usam ternos polidos e limpos, o homem não consegue se livrar de sua natureza desleixada. Ao passo que o "mestre" Lancaster Dodd, interpretado por Philip Seymour Hoffman, consegue ser o oposto - ou tenta ser. Dodd apoia uma filosofia oposta à de Nietzsche, dizendo que o ser humano precisa oprimir seu lado natural para "evoluir espiritualmente". Este é um homem sofisticado, culto, carismático e frio; porém não custa perceber que sua relação com o aprendiz Quell é que ele vê neste o seu lado animalesco oprimido. Pois ele é um animal: quando questionado o mestre não aguenta e tem surtos de raiva, partindo para ofensas. A câmera de Paul Thomas Anderson é um atestado disso também, pois quando os dois são presos e postos em celas vizinhas, o plano capta os dois cômodos, assim como suas reações: o aprendiz chuta e grita de forma selvagem, enquanto o mestre fica calmo e reto - mas não custa para este se contagiar e ficar irritado também.
Isso além da cena que eu considero a mais genial: os dois estão no gramado da casa, no meio de uma reunião, quando o animal joga o mestre no chão, com ambos rolando e rindo - são iguais. Seymour Hoffman também investe nisso: podemos perceber que atrás de todo aquele meticulosismo e certeza se esconde uma insegurança, a dúvida - assim como percebemos que ele inventa a maior parte das coisas no meio de seus discursos. A esposa do mestre, interpretada por Amy Adams, não é diferente: fanática, obsessiva mas claramente hesitante - tanto que vive pedindo para afastar Quell.

Os princípios dos cultos/religiões estão ai: oprimir as dúvidas, se convencer do melhor, do curável. Não é atoa, portanto, que para se iniciar no grupo, Quell tenha que vagar por uma sala, de olhos fechados, tateando uma parede para sentir algo a mais - não deixará de ser uma parede, é você que está de olhos fechados num processo de auto-engano. O filme se mantém neutro à cientologia pois investe na identificação com outras religiões: o mestre poderia ser muito bem um padre (olá, Luz de Inverno!), um pastor, Chico Xavier... O grande momento, sem dúvida, é quando um pequeno personagem usa o raciocínio lógico para questionar os princípios religiosos de Dodd, mas este não consegue responder, se irritando, ignorando. É nessa atmosfera niilista que o homem ganancioso e manipulador de Paul Thomas Anderson não tem vez.

Isso sim é coisa de mestre.

NOTA:





10 Jokers!



Trailer:


NOTAS DA EQUIPE:
Vinicius: 10/10
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